terça-feira, 27 de maio de 2008

Testando, um dois três... Ssssssssssssssssom!

Vâmo tentando, um dia fica bom...
Sensações II
Viriatto molhava o pão no café-com-leite. Um hábito detestável por muitos, mas amado por Ana Lúcia. Quando subiam a rua, cedo pela manhã, em direção à padaria, Ana Lúcia já imaginava aquele pão francês encharcado de leite e café amargo. Sonhava com aquilo, tinha prazer com aquela imagem, mas nunca tivera coragem de contar ao marido. O que ele pensaria dela? Uma tara estranha, diriam, mas funcionava muito bem para Ana Lúcia, melhor que aqueles acessórios que se compra em lojas especializadas.
Já não formavam um casal jovem, beiravam os quarenta, e sua paixão havia sossegado, dando espaço a uma vida tranqüila, sem aborrecimentos e sem acontecimentos novos. Ana Lúcia sempre quis ser mãe, mas Viriatto nunca topara, pois dizia que o dinheiro que ganhava na repartição era muito pouco pra sustentar um bebê, porém mantinha uma vasta e variada coleção de miniaturas de aviões caríssimos no escritório de casa. Ele passava o tempo que dispunha livre montando seus aeromodelos, e ela lendo e assistindo TV. Ana Lúcia fazia serviço comunitário. Ajudava a manter uma creche que ficava a caminho do serviço do marido. A verdade é que, por muitas vezes, Ana Lucia sentia-se infeliz. Sempre que passava por isso, trabalhava mais tempo na creche, porém aquilo se tornava cada vez mais comum e, em um belo dia, decidiu tomar alguma atitude. Ligou para o marido e pediu que ele não a buscasse hoje, pois iria demorar mais tempo no trabalho, porém voltou mais cedo pra casa.
Preparou um belo jantar. A grande mesa da sala de jantar deu lugar à mesinha no terraço. Preparou o lugar com flores e velas. Jogou lençóis vermelhos sobre o sofá da sala de estar, tomou um banho demorado, vestiu seu melhor vestido, a melhor lingerie, perfumou-se. Mais ou menos no horário normal, Viriatto chegou a casa. Abriu a porta de casa e viu, sob seus pés, uma folha de ofício com muitos corações vermelhos desenhados e, escrito com uma rebuscada letra “SUBA!”. Depôs a pasta de couro marrom sobre o aparador, largou as chaves e subiu. Encontrou Ana Lúcia maravilhosa, sentada no sofá, exibindo um lindo par de coxas sob o vestido transparente. “O que é isso?”, perguntou atônito. Ela, por sua vez, não respondeu. Beijou apaixonadamente o marido, que logo abriu um sorriso. Sentaram-se à pequena mesa, e saciaram a fome. Feito isso, Ana Lúcia tomou o marido pela mão e o levou ao banheiro, onde uma banheira morna e perfumada os esperava. Trocavam beijos e carícias, riam alegremente. Dado momento, ela ergueu-se e saiu da banheira. Pediu que, em alguns minutos, o encontrasse no terraço. Viriatto, impressionado e encantando com tudo aquilo, atendeu prontamente o pedido da esposa. Aguardou alguns minutos e subiu de roupão. Lá estava Ana Lúcia. Nua, sentada à frente da mesa. Sobre o móvel um bule de café, uma jarra de leite e uma cesta de pães. Ele pouca atenção deu à refeição servida, estava saciado, e partiu em direção à esposa, que estava linda. Ela o repreendeu com carinho e pediu que sentasse e tomasse o café. Contrariado ele atendeu. Serviu um pouco de café preto e bebeu, partindo para nova investida. Ana Lúcia o interrompeu novamente, perguntando: “Não quer leite e pão, meu amor?”. Entre urros e sussurros ele disse não.
Ana Lúcia aos prantos, vestida só com seu roupão, deixou o apartamento. Vagou pelas redondezas durante toda a perigosa madrugada. Cansada de tanto caminhar e chorar, perto das seis da manhã, resolveu parar em um boteco qualquer, às redondezas de um posto de gasolina. Procurou uma mesa afastada, sentou-se. A certa altura, uma porção de caminhoneiros tentavam se aproveitar dela. O dono do boteco já não conseguia mais conter os ânimos, quando Viriatto irrompe o tumulto, gritando e socando alguns. Arrancou a esposa de dentro do bar a muito custo e a levou de volta pra casa, sem pronunciarem uma só palavra.
Viriatto e Ana Lucia não trabalharam no dia seguinte. Perto das três da tarde, ele a despertou com um beijo. Nos braços trazia uma larga bandeja de café da manhã, que consumiram juntos à cama. Conversaram muito, trocaram carícias e então ele molhou o pão no café com leite.
Depois daquele dia, Viriatto nunca mais tocou na coleção de aeromodelos, e pelo menos três vezes na semana tomam café da manhã no quarto.

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